Monday 14 October 2013

O Louvre, o meu filho e eu

Foto: Thomas Struth

A primeira vez que levei o meu filho a Paris, ele tinha 7 anos. Tínhamos combinado que não íamos visitar mais que um museu por dia (as memórias do meu irmão de 5 anos a fazer birra e a queixar-se constantemente que estava cansado ou que tinha fome, até declarar aos nossos pais “Não mais museus!”, fizeram de mim uma mãe mais ‘calculista’…). Quando chegou o dia de irmos ao Louvre, o acordo tornou-se ainda mais específico: íamos ficar uma hora e íamos ver três peças gregas que eu tinha escolhido para ele e a Mona Lisa, escolha dele, uma vez que tinham falado nela na escola.

Estava a falar dessa visita durante uma aula na semana passada, quando estávamos a discutir se é uma coisa boa ou má que algumas pessoas queiram só dar uma volta num museu. E estarão todas as pessoas que aparentemente estão a dar uma volta a fazer precisamente isso? Se alguém nos tivesse observado no Louvre, teria visto uma mãe a apressar o seu filho de uma sala para a outra, sem prestar atenção à riqueza e à beleza à sua volta. A verdade é que tínhamos um plano, um plano muito pessoal e específico. E quando saímos do museu, estávamos contentes porque tínhamos feito o que tínhamos planeado.

Esta é uma questão recorrente neste blog: a qualidade da visita ao museu, tal como a desejam os curadores e as próprias pessoas. Quando o John Holden definiu os três tipos de guardião no seu ensaio Culture and Class, escreveu sobre os snobs culturais, os neo-mandarins e os neo-cosmopolitas. Definiu os neo-mandarins como aqueles profissionais da cultura que defendem o acesso, mas que querem ser eles a decidir a que é que vale a pena ter acesso. Penso que a maioria de nós pertence a essa categoria. Desejamos o melhor para os visitantes, mas não estamos preparados para admitir que os visitantes também sabem o que é melhor para eles. Queremos impor uma agenda, mas os visitantes têm a sua própria, uma agenda que nem sempre aceitamos como válida ou significativa, a não ser que corresponda de alguma forma aos nossos próprios padrões.

Desejar o melhor para os visitantes e fazer o nosso melhor para o fornecer é a razão porque estamos aqui. Mas há duas maneiras diferentes de o fazer e de o exprimir. Existe a versão neo-mandarim e a versão neo-cosmopolita. Foi no decorrer da aula que referi que me ocorreram dois exemplos concretos.

No início deste ano, pouco depois de assumir a posição de subdirector do Museu Reina Sofia, João Fernandes foi entrevistado pelo jornal espanhol ABC. Houve uma afirmação que chamou a minha atenção: “Queremos que o espectador seja mais lúcido e crítico quando se confronta com a obra de arte, que possa pensar e que não sirva apenas para dizer que esteve lá.”

Percebi, claro, o que quis dizer, mas não gostei da forma como o disse. Não gostei do uso das expressões “queremos que” e “espectador”, senti o desejo do neo-mandarim de ditar, de impor.

Dois meses depois, estava a ler Civilizing the Museum de Elaine Heumann Gurian. E encontrei isto: “ Não somos mais pregadores para os não-iniciados; estamos unidos como parceiros com os nossos públicos e as suas famílias. Devemos ajudar o nosso público, que acredita e confia em nós de uma forma comovente, a tornar-se mais céptico e exigente.”

Parece-me que o desejo é o mesmo expresso por João Fernandes. As palavras, e eventualmente a forma de fazer, são bastante diferentes. Heumann Gurian fala de uma parceria; assume o papel do facilitador e descarta aquele do pregador; sente a responsabilidade que advém da confiança depositada pelas pessoas nos profissionais dos museus.

No que diz respeito à relação entre museus e pessoas, não é como se existisse uma lista de controlo e que os visitantes tenham que fazer e aprender uma série de coisas antes que a sua visita possa ser validada por uma autoridade superior. Mesmo quando os curadores tentam fazer isso, não têm sucesso, simplesmente mantém muitas pessoas afastadas porque não se sentem confortáveis e bem-vindas. O museu é um espaço onde as pessoas vêm para aprender, para se inspirarem, para serem surpreendidas, para serem tocadas, para se divertirem. O pessoal do museu trabalha para garantir as condições para que isto aconteça. Pode ser que tudo isto aconteça de uma vez ou em parte ou que não aconteça de todo e que não aconteça da forma como tinha sido planeado pelo museu. No entanto, penso que a avaliação final só poderá ser feita envolvendo o próprio visitante e considerando igualmente as suas necessidades e expectativas e não apenas aquelas do curador. O museu é um espaço partilhado.

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